Manuel Matola
A associação cívica Transparência Internacional considera “problemática” a manutenção do programa Vistos Gold em Portugal, onde este mecanismo de obtenção de residência para estrangeiros tem vindo a “colocar pressão no mercado imobiliário”, o que aumenta os riscos de corrupção.
O alerta é lançado na nova edição do relatório anual sobre o Índice de Perceção da Corrupção (CPI) publicado esta segunda-feira pela Transparency International que volta a apontar falhas no combate à corrupção em Portugal.
Segundo Karina Carvalho, Diretora Executiva da TI Portugal, “o exemplo Vistos Gold é paradigmático das falhas identificadas porque coloca a nu não apenas a crónica falta de diligência devida, de controlo e de avaliação, suportada por sucessivos governos, mas sobretudo a enorme resistência em instituir a prevenção da corrupção, da fraude e do branqueamento de capitais enquanto política pública”.
O Instituto Nacional de Estatística indicou recentemente que os preços das casas, referentes ao terceiro trimestre de 2022, registaram uma subida de mais de 13% nos preços das casas, enquanto as rendas aumentaram 7,6% para 6,55 euros por metro quadrado no mesmo período.
E num ano particular para Portugal, com a vinda do Papa Francisco ao país, arrendar um apartamento na grande Lisboa durante a semana da Jornada Mundial da Juventude pode custar mais de 3.000 euros e em Fátima 8.000 euros, segundo uma pesquisa nas principais plataformas online feita pela agência Lusa.
Desde janeiro de 2022, os Vistos Gold no setor imobiliário contam com novas regras, pois as atividades de investimento passaram a ser consideradas facilmente elegíveis no caso de os imóveis destinados à habitação se situarem nas Regiões Autónomas dos Açores e Madeira ou em territórios do interior.
No âmbito da aprovação do Orçamento de Estado para 2020 (Lei 2/2020, de 31 de março) e da implementação das mudanças legislativas às autorizações de residência para investimento, o Governo português já havia decidido acabar com os vistos Gold em Lisboa e Porto por forma a aliviar a pressão no mercado (imobiliário, sobretudo) nas duas principais cidades do país.
A ideia visa diminuir a compra de imóveis nas áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa, obrigando à realização de investimento no interior e nas Regiões Autónomas, até porque 90% do investimento estrangeiro é direcionado ao setor imobiliário, sendo que em grande parte dos casos destes imóveis são utilizados como uma fonte de rendimentos aos seus proprietários, nomeadamente para arrendamento por temporada para turistas e através do alojamento local, sobretudo, nas principais regiões do país: Lisboa e Porto.
No entanto, o fim do programa deste tipo de visto não só tem vindo a causar “extrema preocupação” à Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII) como também tem sido alvo de críticas por parte dos partidos políticos, nomeadamente o Bloco de Esquerda, que há dias apresentou um projeto de lei visando proibir venda de imóveis a empresas ou cidadãos não-residentes em Portugal.
A Transparência Internacional (TPI-PT) tem vindo a considerar que a
implementação do programa de Autorização de Residência para Investimento (ARI) pode comportar “muitos riscos”, defendendo por isso que haja “várias regras comuns e harmonizadas” na União Europeia onde existem diferentes países com programas similares.
“É necessário que haja um controlo muito maior a nível de procedimentos dos países e de procedimentos de controlo de cada candidato”, disse Susana Coroado, ex-presidente da Transparência e Integridade em declarações ao jornal É@GORA.
Em artigo publicado no jornal É@GORA, a advogada e Consultora em Direito Migratório, Danielle Miranda de Almeida, considerou que este procedimento, por outro lado, “é para Portugal um enorme estímulo na economia do país, sendo estes vistos responsáveis por ajudar a salvar muitas empresas e a manter empregos na sequência da crise financeira global de anos atrás”.
De resto “trata-se, portanto, de uma excelente opção para o cidadão estrangeiro que tem interesse de investir em Portugal e simultaneamente estar legalizado para permanecer, residir, trabalhar no país, além das vantagens de circular pelo Espaço Schengen sem precisar de visto, para além, daqueles que ainda têm o interesse de adquirir a Nacionalidade Portuguesa”, considerou Danielle Miranda de Almeida.
Segundo a advogada, através deste regime incentiva o investimento de estrangeiros no país – pois “é uma modalidade de visto de residência em Portugal, que concede ao seu titular a autorização para viver no país – e em compensação, o cidadão que preenche os requisitos para solicitar o Visto Gold adquire diversos benefícios, como:
●Entrar no país sem visto de residência,
●Circular pelo espaço Schengen, sem a necessidade de visto,
●Beneficiar-se com o reagrupamento através do pedido de um Golden Visa para seus familiares,
●Trabalhar em Portugal,
●Obter autorização de residência permanente após 5 anos,
●Facilidade para adquirir a Nacionalidade Portuguesa, podendo solicitar a sua aquisição após 5 anos, sem a obrigatoriedade de residir no país durante esse período.
No relatório produzido para 2022, a Transparency International assinala que a Estratégia Nacional Anticorrupção (ENAC) foi lançada sem diretrizes ou plano de monitorização, resultando em “fraca aplicação” e “implementação lenta de medidas dirigidas à prevenção da corrupção” no setor público. (MM)