Segundo o artigo 65 da Constituição Portuguesa: “Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar”. No entanto, ao contrário do texto da norma, o direito à moradia é algo bem distante da realidade de muitos portugueses.
Há poucos quilômetros do centro de Lisboa, capital do país, existe (por enquanto) um local que se assemelha às favelas brasileiras. Marginalidade, sujeira, violência. Quem observa o lugar logo o compara aos níveis de pobreza encontrados no Brasil. O grande problema do bairro 6 de maio está aí: Ele está sendo demolido gradativamente, e o questionamento é: Para onde vão estas pessoas? E onde está o respeito à carta magna que garante o direito à habitação?
Ao voltar no tempo e fazer uma comparação com as favelas brasileiras, a história mostra que a população mais humilde já é marginalizada há muito tempo do que se pensa. No Brasil, por exemplo, quando os mais abastados se estabeleceram no litoral, a primeira reação foi expulsar os pobres dali. O resultado é evidente até hoje: Os humildes tiveram que se deslocar para os morros para viver, e lá estão até hoje.
Daí, o cenário que se vê no bairro 6 de maio, visualmente falando, lembra e muito aquele que se vê no Rio de Janeiro, São Paulo, e nas grandes cidades brasileiras. Mas, é preciso compreender como este bairro português surgiu e assim entender o que passa por lá.
Há anos, o 6 de Maio é conhecido como um lugar tão perigoso e ingovernável que até as ações policiais são mais complicadas de serem executadas. Na realidade, a comunidade foi construída principalmente por imigrantes oriundos de Cabo Verde que chegaram a Portugal no final dos anos 1970, quando o país africano decretou sua independência.
Só que, em 2016, o governo de Lisboa começou a ativamente derrubar o bairro para abrir espaço para novos projetos imobiliários, através de uma série de despejos e batidas da polícia. Passados quatro anos, muitos moradores ainda estão lá. São pessoas que fizeram a vida no local, criaram raízes, e arrancá-las não está sendo um processo fácil.
De origem humilde, aonde vieram sem nada, e com quase nada ainda vivem, os moradores do bairro 6 de Maio estão aos poucos saindo, perdendo suas casas, mesmo vivendo em um local com taxas de criminalidade alta. Ainda assim, se consideram uma grande família, pois as pessoas de boa índole certamente ajudam uma às outras por ali e fizeram este local se manter, financeiramente falando, por tantos anos.
O bairro 6 de Maio não vai existir por muito mais tempo em sua forma atual. Com os despejos e demolições constantes, boa parte do lugar lembra muito uma zona de guerra, onde se vê casas destruídas e sem moradores.
Algumas famílias já saíram e foram deslocadas para viver longe dali, distante dos amigos e de outros parentes. Crianças não vão mais crescer ali, roda de amigos também não existirá. Histórias de vida se fecham a cada fachada destruída pelo trator de demolição.
Em um futuro bem próximo, o bairro só existirá na memória daqueles que o construíram. Onde quer que eles estejam.
As fotos que ilustram este texto foram tiradas pelo fotógrafo José Ferreira e podem ser encontradas em sua rede social. Acesse o perfil dele e veja outras deste trabalho.