Apesar de a covid-19 e a gripe serem duas doenças provocadas por vírus completamente diferentes, um novo estudo sugere que quem toma a vacina contra a gripe enfrenta um risco consideravelmente menor de ser hospitalizado, caso seja infetado pelo novo coronavírus.
De acordo com um estudo publicado no Journal of the American Board of Family Medicine, a vacina contra a gripe parece reduzir significativamente os sintomas de um paciente com covid-19 e, consequentemente, a probabilidade de este precisar de internamento.
A descoberta surge da análise de registos eletrónicos de dois mil pacientes que foram infetados com o novo coronavírus entre março e agosto, sendo que pouco mais de 10% já haviam sido vacinados contra a gripe.
“A gripe e a covid-19 são, de facto, diferentes doenças causadas por diferentes vírus“, enfatizou Ming-Jim Yang, autor principal do estudo. “Embora alguns dos sintomas se possam sobrepor entre as duas doenças, estes poderão ter diferentes consequências a curto e a longo prazo”, explicou.
Além disso, a covid-19 “tem ainda uma taxa de mortalidade muito maior“, observou Yang, acrescentando que os problemas pulmonares, cardíacos e cerebrais de longo prazo observados entre os pacientes de covid-19 “não parecem acontecer com a gripe”.
No entanto, “a nossa equipa analisou pacientes que testaram positivo à covid-19 e viu que os pacientes que receberam a vacina contra a gripe no último ano tinham menos probabilidade de serem hospitalizados e admitidos em unidades de cuidados intensivos”, disse o autor do estudo.
“Pacientes com covid-19 que não tomaram a vacina contra a gripe no último ano mostraram 2,4 vezes mais probabilidades de ser hospitalizados e 3,3 vezes mais probabilidades de precisarem de cuidados intensivos”, disse.
Mas porque é que isso acontece?
“Infelizmente, não sabemos porque é que a vacina contra a gripe teria este efeito secundário benéfico”, disse Yang, acrescentando que o objetivo do estudo não era entender esse aspeto.
No entanto, “se olharmos para os estudos científicos disponíveis, podemos supor que a vacina contra a gripe aumenta a atividade das células assassinas naturais, um tipo de célula imunológica que ataca cancro e células infetadas por vírus”, explicou.
Além disso, estimula o sistema imunológico, o que pode ajudar a combater a covid-19 mais rápida e rigorosamente, diz o estudo.
Michael Niederman, diretor clínico de cuidados pulmonares e intensivos em Nova Iorque, nos Estados Unidos, acrescentou: “As vacinas contra a gripe podem estimular a imunidade antiviral específica [para a gripe]” e a imunidade inata não específica – que pode conferir “proteção adicional contra os sintomas mais graves de covid-19“.
Só o facto de conseguir evitar apanhar gripe, através da toma da vacina, pode ajudar a preservar a prontidão do sistema imunológico do paciente, disse também Chunhuei Chi, diretor do Centro de Saúde Global da Universidade do Oregon, nos EUA.
“Uma coisa que sabemos é que as vacinas contra a gripe são eficazes na prevenção da gripe”, disse Chi. “E quando uma pessoa tem gripe, o seu sistema imunológico fica enfraquecido. Nessas condições, a pessoa fica mais vulnerável à infeção pelo novo coronavírus e, se infetada, [os resultados] tendem a ser mais graves”, justificou.
Por outro lado, quem toma a vacina contra a gripe tende a ser mais cauteloso em relação à sua própria saúde. O que, na opinião de Chi, significa que tem uma maior probabilidade de adotar um “nível mais elevado de práticas de segurança e higiene durante a pandemia”, estando menos exposto ao novo coronavírus.
As pessoas que tomam a vacina contra a gripe “são as mesmas que provavelmente seguem outros conselhos de cuidados preventivos, como usar máscara e manter o distanciamento. E é isso que previne a covid-19, não é a vacina contra a gripe“, disse Niederman.
Serão necessários mais estudos para verificar qual é o mecanismo por trás dos efeitos da vacina da gripe em relação à covid-19. Mas a verdade é que “os benefícios parecem existir”, disse Yang.