O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras lançou sexta-feira mais de 15 mil vagas para o reagrupamento familiar e 13,624 lugares para pedido de concessão de Título de Residência para familiares de cidadãos da União Europeia. Mas após a abertura, a “voz do silêncio” que ecoa do outro lado da linha telefónica do SEF travou sonhos de vários imigrantes que liga(ra)m sem cessar em busca de uma oportunidade de se legalizar ou reunir seus familiares em Portugal.
“Nessa sexta-feira ficamos nós os quatro tentando ligar das 14h as 20h. Com mais de 20 mil ligações e não conseguimos”, conta o imigrante brasileiro Airton Fulber que centra o desejo num só ponto: “O que mais quero mesmo agora é conseguir marcar o agendamento para minha família”.
Quando há quatro anos Airton Fulber traçou o plano de morar com a família em Portugal organizou-se de “todas as formas (possíveis), inclusive financeiramente” para poder “estar 100% de forma legal” com a família e não passar pela situação de angústia que está hoje a enfrentar.
Airton Fulber está em Portugal há sete meses e desde lá que diariamente sente “agonia e desespero”. E não é um receio despropositado, segundo conta ao jornal É@GORA.
“Eu entrei com visto de residência e com agendamento no SEF emitido pelo consulado de Portugal no Brasil para o dia 01/06” e “15 dias após já estava com minha Autorização de Residência. Mas minha esposa e meus dois filhos (de 14 e 16 anos) ainda não. E inclusive já se passaram os 180 dias de validade da estadia deles como turistas”.
O risco de ilegalidade que a família do brasileiro corre faz hoje com que os dois filhos de Airton Fulber vejam esmorecer sonhos futuros: é que o de 16 pode não ver materializado o “desejo de se tornar médico” e a “intenção de dedicar uma parte da vida profissional prestando serviço público aqui em Portugal como forma de agradecimento pelo acolhimento”.
Por outro lado, o de 14 anos está em risco de não renovar a inscrição no futebol no Clube de Loures, “pois não tem documento ainda válido para Portugal”, conta Airton Fulber ao revelar ao jornal É@GORA “algumas coisas” ligadas à questão do Reagrupamento Familiar que o estão a deixar a si e a família angustiados e “realmente muito apreensivos”.
Mas há um episódio familiar que o aflige antecipadamente, adianta: “A minha esposa tem a mãe no Brasil que está adoentada e caso precise ir ao Brasil não sabemos como é se poderá entrar novamente em Portugal”.
E “enquanto isso não se resolve”, o brasileiro apresenta uma proposta de solução sobre o que poderia ser feito pelo SEF.
“Todos os cidadãos que têm Autorização de Residência (como é o meu caso) poderiam ir ao site do SEF e registar os seus familiares e enviando digitalmente os documentos. Esta Autorização de Residência EMERGENCIAL teria validade de 6 a 12 meses, e após isso seríamos chamados dentro desse período para irmos até uma delegação para fazermos a AR”, sugere Airton Fulbe em declarações ao jornal É@GORA.
Desde o fim da tarde de sexta-feira, há palavras que mais ressoam nos vários grupos de whatsapp e facebook de imigrantes de várias nacionalidades que buscam auxílio informacional: as de angústia e esperança para a legalização.
Esta é uma situação “desanimadora e ao mesmo tempo um desespero, pois para abrir novamente (as vagas) provavelmente só daqui há uns 6 meses”, diz o brasileiro Airton Fulber, baseando-se na forma como o SEF operou nos últimos meses.
As vagas para o reagrupamento familiar estavam fechadas durante meses: O SEF “abriu no dia 5 de maio e (o processo) durou até ao dia 10 de maio”, lembra a imigrante Sónia Gomes, uma cabeleireira que nas horas vagas da sua profissão ajuda centenas de cidadãos estrangeiros no processo de regularização dos estrangeiros através do reagrupamento familiar.
A incerteza de uma resposta imediata para o desesperante contacto telefónico dos serviços migratórios portugueses levou o brasileiro Rafael Lima a recorrer ao aplicativo redial, usado sobretudo em telemóveis Android para fazer a “rediscagem automática” se a linha estiver sistematicamente ocupada. Com o aplicativo que instalou no seu telemóvel, o imigrante liga e redisca várias vezes até que alguém atenda do outro lado da linha.
“O jeito é ligar sem cessar!”, diz Rafael Lima sobre o sucesso alcançado na sexta-feira, dia em que o SEF o atendeu “a partir das 18:45” por “duas vezes”.
“Consegui fazer o agendamento para o reagrupamento familiar. O esquema é ligar nas primeiras horas e nas duas últimas horas de atendimento”, diz o imigrante sobre o truque que usou revelado num dos vários espaços de interação virtual de imigrantes em Portugal em que o jornal É@GORA é um dos convidados.
Desde o anúncio do SEF nesta sexta-feira, cresceu a solicitação ao grupo de whatsapp dirigido pela cabeleireira Sónia Gomes, uma das três mães brasileiras que diariamente dedicam parte considerável do seu tempo nas redes sociais e telefonicamente a fornecer informações corretas e responder questões lançadas por quem procura tirar dúvidas sobre qual a documentação necessária para apresentar no SEF no ato de agendamento para trazer a família a Portugal.
A quase totalidade das perguntas de esclarecimento aí lançadas terminam sempre com um pedido de apoio: “ajudem-me!”.
A poucos minutos da meia-noite de sexta-feira, Sónia Gomes ameaça encerrar temporariamente o grupo com a promessa de que na próxima segunda-feira o processo de agendamento de reagrupamento familiar poderá ser risonho para os imigrantes que tentam contactar o SEF.
“Calma pessoal … acalmem os corações que hoje foi um dia tenso, mas segunda-feira vamos voltar com força …”, escreve Sónia Gomes.
Ainda assim, ao longo do sábado, há quem voltou a tocar no ponto para lembrar a “voz do silêncio” que ecoa do outro lado da linha telefónica do SEF que atende ao calhas. (MM)