José Sena Goulão / Lusa
O diretor diretor executivo da petrolífera Partex, António Costa Silva, convidado pelo Governo para estudar um plano de retoma económica para o período pós-pandemia, já apresentou as suas ideias ao Executivo socialista.
Num documento com 119 páginas, sob o título “Visão estratégica para o plano de recuperação económica e social de Portugal 2020-2030″, o gestor apresenta aos ministros do Governo liderado para António Costa os seus planos para a retoma.
O plano, a que o jornal Eco e o Expresso tiveram acesso, aponta as infraestruturas como um dos pontos essenciais no plano de retoma, considerando o gestor que é essencial para o país terminar a a construção de alguns destes projetos que, na sua opinião, são indispensáveis para que Portugal tenha sucesso no século XXI.
“O país tem acumulado muitas polémicas sobre as infraestruturas. É agora o tempo de as fazer”, começa por escrever no seu plano gestor da Partex.
“Numa primeira fase, a construção das infraestruturas vai ser uma alavanca da economia nacional, arrastando todo o setor da construção, dinamizando as empresas nacionais e os fornecedores de equipamentos e serviços e, consequentemente, promovendo o emprego”.
No que toca à ferrovia, Costa e Silva considera importante concluir os projetos em curso e modernizar a rede portuguesa, apontando também para a construção de um eixo ferroviário de alta velocidade Porto-Lisboa para passageiros, começando com o troço Porto-Soure (onde existem mais constrangimentos de circulação).
“Esta ligação potenciará a afirmação das duas áreas metropolitanas do país e o seu funcionamento em rede Para além dos ganhos de conetividade e articulação, esta obra trará grandes ganhos ambientais por dispensar as ligações aéreas”, aponta.
O gestor tem também planos as ligações aéreas: escreve que é importante construir um aeroporto para a Grande Lisboa, considerando que esta infraestrutura será importante não só do ponto de vista do turismo, mas também em “muitas outras fileiras económicas”.
E não esquece o Norte: “Assegurar que todo o país, em particular a região norte, onde há uma concentração elevada de empresas exportadoras, tenha uma cobertura adequada de ligações aéreas, que são essenciais para estimular a competitividade”.
Costa e Silva defende também a expansão e reforço das redes de Metropolitano de Lisboa e do Metro Ligeiro do Porto, bem como o alargamento da competitividade do porto de Sines e de outros portos nacionais, tal como frisa o Eco.
Hidrogénio verde e turismo
Apesar do destaque nas infraestruturas, Costa e Silva destaca outras áreas que considera importantes. No setor da reindustrialização, sublinha-se a promoção de uma nova fileira industrial com potencial exportador e gerador de riqueza, em torno do hidrogénio verde.
Para o hidrogénio, estabeleceu um plano “visando orientar, coordenar e mobilizar o investimento público e privado em projetos nas áreas da produção, do armazenamento, do transporte e do consumo e utilização de gases renováveis”.
E detalha: “Este plano deve visar em particular o lítio, o nióbio, o tântalo e as terras raras, devendo propiciar um estímulo às empresas para desenvolverem estes recursos, e encontrarem, em particular para o lítio, um processo de tratamento que possa aumentar a sua competitividade e gerar valor, associada com o desenvolvimento de fileira industrial nacional de valorização do recurso, aplicando os princípios de Green Mining.
No que respeita ao turismo, “país deve promover um grande plano para captar a atenção dos mercados mais importantes com base nas valências que Portugal apresenta em termos da sua diversidade geográfica e paisagística”.
“A oferta deve ser diversificada, explorando as diferentes partes do território e é importante apostar na qualidade e ter como indicadores não só o número de visitantes, mas também a rentabilidade por turista”, escreve ainda o gestor.
Para a recapitalização das empresas, Costa e Silva defende a “criação de um fundo, de base pública, de capital e quase capital, aberto a fundos privados, para operações preferencialmente em coinvestimento, dirigido a empresas com orientação exportadora e potencialidades de exploração de escala”.
No aspeto social, “deverão ser lançadas (…) medidas de estímulo à requalificação e reabilitação de habitações devolutas para serem atribuídas a famílias e pessoas carenciadas (…) deve ser promovido um programa de gestão do património imobiliário do estado, para identificação dos imóveis passíveis de serem reabilitados e orientados para o arrendamento social. (…) é [também] crucial reforçar os programas de arrendamento a preços acessíveis para a classe média, em particular para os jovens”.
Já para a saúde, o gestor da Partex defende a “conclusão da rede do SNS com o novo Hospital de Lisboa Oriental, o novo Hospital do Seixal, o novo Hospital de Évora, o novo Hospital do Algarve, a requalificação do parque e da tecnologia hospitalar e a ampliação da Rede Nacional de Cuidados Continuados para a dimensão já prevista”.
Ao todo, são dezenas de propostas apresentados em traços gerais categorizados em dez pontos cruciais: ferrovia, reindustrialização, reconversão industrial, recapitalização das empresas, Estado, turismo, transição energética, saúde a questão social.
“Não vamos ter ilusões”
No mesmo documento no qual detalha os seus planos para a recuperação económica e social de Portugal, o consultor deixa claro que o período que se avizinha não será fácil e apresenta uma previsão do PIB até duas vezes mais pessimista do que a do Governo.
“Não vamos ter ilusões”, começa por escrever logo no início do documento, citado pelo semanário Expresso. E vaticina ainda: “A crise sanitária causada pela doença COVID-19 traz consigo uma profunda recessão económica que tem características globais e que vai ferir profundamente a nossa economia”.
Quanto ao Produto Interno Bruto português, mostra-se bem mais pessimista do que o Governo. “O país pode vir a enfrentar uma das piores crises da sua história: a queda do PIB em 2020 pode chegar aos 12%; a queda do consumo aos 11%; a queda do investimento aos 26% e a taxa de desemprego aos 11,5%”, estimou.
As previsões do Governo são bem mais otimistas, apontando uma contração da economia portuguesa na ordem dos 7%, estimando uma queda de 4,3% para o consumo, de 12,2% para o investimento e uma taxa de desemprego de 9,6%.
“A partir de setembro de 2020, a situação de muitas empresas pode deteriorar-se significativamente e é fundamental existir no terreno um programa agressivo para evitar o colapso de empresas rentáveis, que são essenciais para o futuro da economia portuguesa”.
Trata-se de um desafio de ordem “gigantesca” que carece de resposta “urgente”.
“O espaço temporal que vai mediar entre a significativa deterioração da economia no segundo semestre de 2020 e a chegada da ajuda europeia em 2021, pode ser fatal para muitas empresas se não existirem respostas adequadas”, alerta ainda.
Costa e Silva foi nomeado pelo Governo no início de junho para para desenhar o Programa de Recuperação Económica e Social 2020-2030.
“Designa-se o prof. Doutor António Costa Silva, Professor do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa e presidente da comissão executiva da Partex Oil and Gas, cuja idoneidade, experiência e competências são publicamente reconhecidas, para assegurar a coordenação dos trabalhos preparatórios de elaboração do Programa de Recuperação Económica e Social 2020-2030”, lê-se despacho publicado em Diário da República.
A nomeação oficial surgiu depois de o semanário Expresso ter avançado, a 30 de maio, que António Costa tinha convidado Costa e Silva, descrito como “um gestor independente do PS”, para assumir o cargo, que não tem qualquer remuneração associada.