Rodrigo Antunes / Lusa
O padre Vítor Melícias, presidente da Assembleia Geral do Montepio, diz que Tomás Correia “faz falta, mas fez muito bem” em abandonar a liderança da mutualista Montepio. “Dizer que Tomás Correia continua a controlar através de mim é um disparate”, considera ainda, abordando o “mito” da sua influência junto do poder político.
Numa entrevista ao jornal i, o padre Vítor Melícias não fala directamente das buscas realizadas recentemente ao Banco Montepio, mas salienta que espera que os tribunais façam o que lhes compete. Quanto a Tomás Correia refere que vai “fazer falta” no Montepio, mas que “fez muitíssimo bem” em sair por causa do “ruído todo” e do desgaste da sua imagem. Tal como na Igreja, “um padre, quando faz asneira, afecta a Igreja toda, até o próprio Papa”, refere em jeito de comparação.
Tomás Correia “tinha os problemas de ser arguido ou de ser suspeito disto ou daquilo — coisas que não sei e, se houver alguma coisa, deve ser julgado, primeiro, pela sua consciência, segundo, pela história e, se for caso disso, pelos tribunais”, sublinha.
“Os ataques foram tão fortes que [Tomás Correia] se fartou e foi-se embora. E é um homem que faz falta na área da economia social. Mas face a todo o clima que se criou, no lugar dele faria o mesmo”, considera ainda.
“Dizer que Tomás Correia continua a controlar através de mim é um disparate“, acrescenta, salientando que “ele já não está lá, não comanda, não tem nada a ver com aquilo”.
O padre Vítor Melícias não duvida de que ele “fez um bom trabalho” na mutualista e frisa que se “tivesse saído mais cedo era capaz de não ter sido mau para a sua imagem”.
Melícias entende que “o Montepio sempre foi uma coisa perfeitamente apetecível”, mas alerta que só por “incompreensão” se pode pensar que “o que aconteceu ao BES iria acontecer ao Montepio”. “Isso não seria possível porque o BES e a família do grupo BES são duas realidades da economia privada, da economia lucrativa, que podem fazer, efectivamente, determinado tipo de negócios”, aponta, concluindo que “num banco de economia social, como é o caso da caixa económica [Banco Montepio], não há esse perigo”.
O padre também sustenta que os associados “não perdem o seu capital porque não têm capital”. “Não há propriedade privada. Uma pessoa paga quotas numa associação mutualista, mas não é dono daquele capital. Se morrer, não fica para os herdeiros porque aquilo não é dele. Trata-se de uma associação de pessoas, não uma associação de capitais”, destaca.
Sobre a sua vida pessoal, Vítor Melícias garante que nem sequer tem uma bicicleta e que nem o dinheiro que recebe é seu. “É dos frades”, vinca, apontando que “dos cerca de 4 mil euros” que ganha, “3 mil vão para os frades”. “Não tenho automóvel, não tenho nada nem quero ter”, assegura na entrevista ao i, onde diz que gere a sua vida com cerca de 900 euros.
“Eu preciso de me mexer, tenho de pôr gasóleo no carro, que não é meu, mas tenho de abastecer, tenho de ir ao médico”, nota o antigo comissário para a transição de Timor para a independência e ex-administrador do Montepio que recebe uma pensão da Segurança Social, outra pensão enquanto associado do Montepio e ainda uma “compensação salarial” como ex-administrador do Banco.
As contas feitas pelo Polígrafo, em Maio de 2019, concluíram que o padre recebe cerca de 4.597,25 euros, com cerca de 3 mil a serem entregues ao Convento do Varatojo, em Torres Vedras. O restante montante fica “numa conta com o nome de Vítor Melícias e do ecónomo da província dos frades”, relatou ao Polígrafo o próprio padre. “Eu tenho a administração directa [da conta], mas nós não temos direito de propriedade, aquele dinheiro não é meu“, apontou na altura.
Na entrevista ao i, o padre Vítor Melícias ainda recusa a ideia de que tem influência junto do poder político. É “um mito”, assegura, notando que só tem “muitos e grandes amigos em todas essas áreas e em todos os sectores”, sem ter “partido nem interesses”.